sexta-feira, 16 de março de 2012

SAMBURÁ

Chamávamos o Frederico de Fred, depois passamos a chamá-lo de Samburá.
Isso porque peixe era a principal refeição do Samburá. Seu pai era lagosteiro,
possuía três barcos de pesca e uma parafernália tecnológica -em cada barco-
para melhor achar o crustáceo.

Pois bem, o Samburá tinha alguns problemas. Além de comer peixe, ele
trabalhava com o pai. Tinha sempre o cheiro doce-cobre dos peixes: sempre
impregnado em suas roupas, cabelos, pele, hálito, carro, casa, em tudo.

Quer saber o dia do aniversário do Samburá? 28 de fevereiro. Isso lhe
garante, na astrologia, ser do signo de peixes. Já pensou? Eu não creio em
astrologia, mas que isso vale nessa história, ah!, vale sim!

Outras: quando íamos ao McDonalds, era exatamente o McFish o pedido do
Samburá; pizzas? Sempre de atum.

Pois bem, o tempo não perdoa. O Samburá cresceu e deu continuidade aos
trabalhos do pai: as lagostas. Com um empréstimo no BNB somado às economias de
alguns anos, comprou e montou uma fazenda em Fortim, litoral leste do Ceará.
Viveiros de camarão. O nome da fazenda? 'Recanto do Samburá'. Bem sugestivo,
não?

Com o cheiro que ele tinha, sempre encontrou problemas em arranjar
namoradas. As casas de massagem eram os refúgios sexuais do Samburá, enquanto
os refúgios emocionais ficavam a nosso cargo mesmo, afinal de contas, éramos os
seus amigos. Depois passou a comer as filhas dos pescadores. Até que casou com
a filha de um empregado, de um pescador que cheirava a peixe também.

Por que eu escrevi essa história? Explico. Recebi um emeio no dia 12 de
agosto, dizia assim:

"Poeta, Pôxa, cara, você é difícil de encontrar. Consegui seu
e-mail com (...) Faz 5 anos que casei, meu primeiro filho nasceu semana
passada. Terei um Dia dos Pais de verdade!!! (...) Anota os meus telefones
todos (liga a cobrar, viado!!!), vamos combinar uma visita aqui em casa, passar
um final de semana na fazenda. (...)

Atenciosamente,

Fred Samburá"

É. Deu saudade do jeitão melancólico-quieto-metido-a-feliz do Fred,
sempre roendo as unhas e as carnes dos dedos, como se aquilo fosse remédio para
alguma coisa. Talvez fosse mesmo.


O cara com cheiro de peixe que, no colégio, sempre -sempre mesmo- terminava as provas antes de todo mundo, e conseguia boas notas. O amigo do mar que ia conosco aos shows, e, provavelmente por sentir-se um estranho -um verdadeiro peixe fora d'água, permanecia eternamente de braços cruzados a olhar as bandas tocarem -mesmo quando essas bandas eram Titãs, Paralamas do Sucesso, Cazuza & Barão Vermelho, Legião Urbana, Engenheiros do Hawai... Ah!, lembro de um show do Roberto Carlos, quando o Samburá deu a sua primeira e única reação: sorrir, dançar e cantar a música "Verde e Amarelo". Creio que aquela manifestação ficará sempre na memória de nossa turma. Feliz anos 1980.

Um comentário:

  1. Estou feliz demais com teu texto, poetamigo!
    Voltou a poética e como aprecio essa marcante narrativa que possuis com gosto de vida...
    Me emocionei!
    Abraço e muitas muitas saudades!
    Lia Maia @

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